sábado, 27 de julho de 2013

Quando a escola contribui para a baixa autoestima do aluno


Essa reflexão partiu após uma das sessões psicopedagógicas utilizando o jogo Ludo. Apesar de parecer um jogo simples, o Ludo pode ser adaptado de diversas maneiras e, assim, serem trabalhados alguns temas, além dos de conteúdo escolar, como a matemática, leitura e escrita.  Nessa última adaptação feita com o jogo, o principal objetivo era trabalhar a escrita e abordar o tema 'sentimento', que, logicamente, para algumas crianças, serviria como um desabafo.

A regra era a seguinte: ao ser lançado o dado, se caísse o número 1 ou 6, ou se o peão caísse em uma das casas coroadas, a criança deveria escrever qualquer sentimento que lhe viesse em mente, naquele momento. Inclui minha participação nesse jogo, de forma que eu faria com que eles lessem o que eu iria escrever, para saber o avanço que alguns já obtiveram nesse campo. 

O resultado foi surpreendente! Além de ser bom porque o meu objetivo foi alcançado, foi surpreendente, porque ao revelar na escrita o que eles sentiam naquele momento fui fazendo alguns questionamentos, e a resposta que obtive de um deles me deixou comovida. Uma das crianças verbalizou: " Eu não sei explicar o nome do sentimento, mas é uma coisa... sabe uma coisa que você sente, assim, que dá um 'nó' no peito? Porque eu quero aprender a ler logo."

O que essa mesma criança não sabia, porque talvez ainda não tivessem dado esse reforço positivo para ela, é que ela está lendo, sim. Das cinco palavras que escrevi essa criança leu quatro. Da forma dela, naquela fase inicial da leitura, mas leu. O que considerei um grande avanço para quem anteriormente não conseguia nem identificar, mesmo aos oito anos de idade,  as letras do alfabeto. E foi o que mostrei para ela naquele momento. Disse que estava começando a ler, que eu estava muito feliz por essa primeira vitória e que seguiria avançando cada vez mais, no seu próprio tempo. Falei que não precisava sentir o tal "nó" no peito , pois conseguirá o que tanto almeja, já estava conseguindo.

Após este momento, passei a refletir o quanto essas crianças são cobradas, muitas vezes de uma forma cruel. O quanto seu esforço, suas angústias não são levadas em conta. Essa mesma criança chega em casa todos os dias com o diário cheio de recados da professora dizendo que ela não prestou atenção na aula, que estava brincando com os coleguinhas, que não se interessou por determinada tarefa, que se negou a copiar o que estava escrito na lousa, enfim, não vi qualquer recado que servisse de estimulo a essa criança. Logicamente, com tantas observações negativas, a mãe se vê ansiosa, aflita e se culpa pela dificuldade do seu filho. E qual a forma que ela encontra para tentar desfazer o seu "erro"? Puni-lo sempre que receber os recados e sempre que receber o boletim.

Infelizmente essa é a realidade de muitas crianças que possuem algum tipo de dificuldade ou transtorno de aprendizagem. São mal compreendidas, são tidas como preguiçosas, desinteressadas e quando essa visão parte do professor é o que mais nos entristece, porque o professor é quem deveria ser o primeiro a ter um olhar diferenciado e acolher o aluno,  tentar reconhecer que aquele sujeito precisa de ajuda, não de críticas, não de punição. 

E se a criança já vem fazendo o acompanhamento psicopedagógico, agora é a vez do professor buscar ajuda para saber lidar com sua ansiedade, angústia, muitas vezes provenientes de um sistema escolar, que ao invés de ser transformador e redentor, desmotiva e adoece educandos e educadores.

2 comentários:

  1. Ótima reflexão. Semana passada, durante um evento que reuniu profissionais de diversas áreas em uma das escolas onde leciono, um psicanalista citou justamente essa visão que o professor precisa ter para com seus alunos - sobretudo professores de educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental.

    Expressões como "você não faz nada certo" ou "você é terrível, só faz bagunça", dentre outras, são péssimas para uma criança porque comprometem a autoestima e reforçam estereótipos que serão internalizados pelos pequenos. Essas expressões são ditas por muitos pais (infelizmente) e os educadores precisam tomar cuidados para não repeti-las, mesmo em contextos nada favoráveis como o atual sistema escolar - as crianças não têm culpa.

    Parabéns pelo artigo! :)

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    1. Com certeza, colega, ótima colocação a sua. Infelizmente, esse é um dos problemas que têm sido bastante frequentes. Que bom que gostou! Vou tentar trazer minhas experiências aqui mais vezes. :)

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